A Justiça do Maranhão determinou, nessa segunda-feira (8), o afastamento por 180 dias das secretárias municipais de Buriticupu, Chrystiane Piancó Lima (Saúde) e Áurea Cristina Costa Flor (Assistência Social), por suspeita de omissão e fraude no sistema de proteção à criança e ao adolescente.
Segundo investigação do Ministério Público do Maranhão (MP-MA), a gestão municipal de Buriticupu admitiu ter inserido dados falsos no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Pré-natal de adolescentes era registrado como "violência sexual" para ocultar falhas na rede e não comunicar casos reais (entenda mais abaixo).
Além das secretárias, também foram afastados dos cargos o diretor de Proteção Social Especial, Paulo Sérgio Pereira Mendes, e o assessor jurídico da Procuradoria-Geral do Município, Alexandre Florentino Magalhães.
A decisão liminar, que teve como base uma denúncia apresentada pelo Ministério Público, ainda proíbe os denunciados de manter contato com testemunhas e servidores das secretarias e do Conselho Tutelar, além de restringir o acesso às sedes dos órgãos e aos sistemas de informação. A Justiça também autorizou busca e apreensão de dados do Sinan e de e-mails institucionais. A operação foi realizada na manhã desta terça-feira (9).
Procuradas pelo g1, as secretárias Chrystiane Piancó e Áurea Flor e a Prefeitura de Buriticupu ainda não se manifestaram sobre o afastamento. Já Paulo Sérgio Pereira Mendes e Alexandre Florentino Magalhães não foram localizados para comentar o afastamento.
Entenda o caso
Em 6 de agosto, a 1ª Promotoria de Justiça de Buriticupu encaminhou uma recomendação ao prefeito de Buriticupu, João Carlos Teixeira da Silva, solicitando a reorganização da rede de proteção a crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência.
Entre as medidas propostas estavam:
criação de um comitê de gestão da rede, com participação das Secretarias de Saúde, Assistência Social e Educação, Polícia Civil, Conselho Tutelar e acompanhamento do MP;
formalização de fluxo e mecanismos de comunicação entre os órgãos;
adoção de ficha padronizada para registros de casos de violência;
implementação de programas de capacitação obrigatória e periódica para os profissionais da rede;
elaboração de um plano de monitoramento da rede para avaliar o impacto social das medidas;
criação de grupo de trabalho permanente entre Prefeitura e MP;
adoção de uma política de comunicação pública baseada em dados verificáveis, evitando informações imprecisas ou acusações levianas.
De acordo com o promotor de Justiça Felipe Augusto Rotondo, após a recomendação, as investigações identificaram um cenário de colapso da rede de proteção. Dos 105 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes notificados no Sinan, pelo menos 95 não foram comunicados à Polícia Civil, o que configuraria “omissão sistêmica e deliberada”.
O promotor destacou ainda que, em 5 de setembro de 2025, a gestão municipal reconheceu formalmente, em ofício, a prática de inserção sistemática de dados falsos no Sinan. Atendimentos de pré-natal de adolescentes eram registrados como “violência sexual”, com o objetivo de justificar a ausência de comunicação dos casos reais e encobrir falhas na rede.
“O ponto culminante da investigação foi a confissão formal da gestão municipal, em ofício protocolado em 05/09/2025, de que praticava a inserção sistemática de dados falsos no Sinan codificando atendimentos pré-natal de adolescentes como ‘violência sexual’ para, segundo alegado, justificar a não comunicação dos casos reais e mascarar a falha primária da rede”, explicou o titular da 1ª Promotoria de Justiça de Buriticupu.
Denúncias
Com base nesses elementos, o MP denunciou as secretárias Chrystiane Piancó Lima, Áurea Cristina Costa Flor e Paulo Sérgio Pereira Mendes pelos crimes de:
omissão de comunicação (art. 26 da Lei Henry Borel);
falsidade ideológica (art. 299 do Código Penal);
denunciação caluniosa (art. 339 do Código Penal);
desobediência qualificada (art. 10 da Lei nº 7.347/85).
Já Alexandre Florentino Magalhães foi denunciado por patrocínio simultâneo ou tergiversação (art. 355 do Código Penal), por ter atuado de forma irregular na defesa pessoal das gestoras enquanto exercia cargo público.
Ação por improbidade administrativa
Paralelamente à denúncia criminal, a 1ª Promotoria de Justiça de Buriticupu ajuizou Ação Civil Pública por improbidade administrativa contra as secretárias Chrystiane Piancó Lima e Áurea Cristina Costa Flor.
Segundo o MP, ao longo das investigações, as gestoras violaram de forma reiterada os princípios da legalidade, publicidade e lealdade às instituições. Notificadas diversas vezes para apresentar documentos essenciais sobre a comunicação dos casos de violência, elas teriam adotado um padrão de obstrução, entregando respostas evasivas, incompletas, fora do prazo ou simplesmente ignorando as requisições.
Para o promotor Felipe Rotondo, a conduta das secretárias não foi fruto de negligência, mas sim uma ação dolosa, com o objetivo de ocultar falhas graves e evitar responsabilização administrativa e criminal.
Se condenadas, as duas podem ser punidas com multa civil e proibição de contratar com o poder público.
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