Responsável pelo licenciamento dos parques eólicos instalados em alto-mar, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) defendeu a aprovação de um planejamento espacial marinho com regras claras de mitigação e redução dos impactos socioambientais. O tema foi debatido em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (5).
As eólicas offshore, como são conhecidas, só começaram a ser discutidas no instituto em 2017 e têm amparo nas recentes iniciativas de matriz energética mais diversa e menos poluente, sobretudo em tempos de mudanças climáticas. Hoje, existem cerca de 100 projetos em análise. Porém, há impactos evidentes (ruídos, sombreamento, sobreposição, etc.) sobre ecossistemas marinhos e atividades socioeconômicas, como a pesca e a exploração de petróleo.
Engenheiro ambiental, o coordenador-geral substituto de licenciamento do Ibama, Breno Bispo, citou dificuldades na conciliação dessas atividades. “Tem a disputa territorial entre os próprios parques eólicos e os outros usos de exploração de petróleo, pesca artesanal, rotas de navegação, etc. E, para isso tudo, é necessário fazer um planejamento marinho que, em princípio, não é papel do Ibama. Mas, se nada for feito, esse conflito terá de ser solucionado na esfera do licenciamento ambiental, o que a gente não deseja”, ressaltou.
Lei do Mar
Doutora em ecologia marinha, a diretora do Departamento de Oceano e Gestão Costeira do Ministério do Meio Ambiente, Ana Paula Prates, afirmou que parte desse planejamento está presente no projeto da Lei do Mar (PL 6969/13), pronto para votação no Plenário da Câmara. Ela afirma que a busca de soluções urgentes para a crise climática deve inserir o tema também no Projeto de Lei 11247/18 e apensados, que buscam a regulamentação das eólicas offshore e estão em análise na Comissão de Meio Ambiente da Câmara.
“Nós estamos trabalhando na questão do planejamento espacial marinho, que a gente até está chamando de instrumento de descarbonização, mas que não está dentro do PL 11247/18”.
Ana Paula Prates informou que o governo federal busca a retomada do gerenciamento costeiro; a elaboração de políticas de conservação de ecossistemas vulneráveis, como manguezais e recifes de coral; a ampliação das unidades de conservação marinhas; e a inclusão de metas costeiras nas metas voluntárias do Brasil para a mitigação das mudanças climáticas.
Comunidades tradicionais
A audiência na Câmara foi pedida pela deputada Talíria Petrone (Psol-RJ), que cobrou “transição energética com justiça climática”. “Um empreendimento que ganha o nome de energia limpa precisa, de fato, mitigar ou reduzir totalmente os impactos ambientais e sociais. Não estamos aqui contra a energia limpa, mas ela precisar ser efetivamente guardiã dos nossos biomas, povos e comunidades tradicionais”, afirmou.
Coordenadora do Laboratório de Geoprocessamento e Cartografia Social da Universidade Federal do Ceará (UFCE), a geógrafa Adryane Gorayeb ajudou a mapear 324 comunidades tradicionais de pescadores artesanais, indígenas e quilombolas ameaçadas por 23 projetos eólicos no litoral cearense.
“Os parques offshore não só estão sobre a área de pesca – de curta, média e longa duração – como também impedem a navegação, ou seja, a chegada e o retorno dos pescadores nessas áreas”, explicou.
Dirigente da Articulação Povos de Luta do Ceará, Carine Santos Silva cobrou providências. “O discurso catalogando a energia eólica offshore como fonte de energia limpa e sustentável perde o efeito quando nos deparamos com a realidade dos problemas que afetam a vida das comunidades que têm a pesca artesanal como base de sua atividade econômica, cultural e de subsistência”, alertou.
Durante a audiência, também houve críticas aos impactos socioambientais dos parques eólicos em terra firme, chamados de “onshore”. Nesse caso, o licenciamento cabe aos órgãos ambientais dos estados. O Ibama só licencia os empreendimentos em áreas limítrofes de estados, em zonas de fronteira ou por decisão judicial.
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