Cientistas e representantes de organizações da sociedade civil denunciaram o “tsunami de plástico” no Brasil e no mundo e defenderam uma série ações para conter esse tipo de poluição durante seminário da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados realizado na quinta-feira (24).
Segundo os especialistas, o Parlamento pode contribuir por meio da aprovação de propostas de reuso e reciclagem de plástico (PL 2524/22), em análise no Senado, e de uso racional do produto (PL 612/07 e 63 projetos apensados), em discussão na Câmara.
O tema também é debatido internacionalmente na Organização das Nações Unidas (ONU) por meio de um tratado global para o fim da poluição plástica. A diretora-executiva da ACT Promoção da Saúde, Paula Johns, acompanha as negociações em torno do tratado, que tem texto final previsto para o fim de 2024, e pediu mobilização de toda a sociedade.
“Quando a gente fala de um tratado global vinculante, o primordial é reduzir a produção de plástico. O tema da saúde é a grande potência que a gente tem para conseguir avançar com esse tratado de forma efetiva”, disse.
O plástico é poluente de preocupação global devido à lenta decomposição (cerca de 400 anos) e à crescente produção, que atualmente está em torno de 400 milhões de toneladas por ano. Corresponde a 32% dos resíduos sólidos, mas tem baixa taxa de reciclagem: 9% no mundo e apenas 4% no Brasil.
Microplásticos
Biólogo e doutor em oceanografia, o professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Ítalo de Castro afirmou que a situação é agravada pelos microplásticos resultantes da fragmentação de utensílios maiores e também presentes em fibras têxteis e produtos de cuidados pessoais.
“Todo mundo já viu fotos de tartarugas, golfinhos e peixes emalhados em rede de pesca e de tartarugas comendo sacolas plásticas. Embora essas imagens sejam comoventes, o maior problema não está aí”, comentou. “Uma parcela de resíduos que geralmente não enxergamos afetam uma quantidade muito maior de organismos vivos – moluscos, vermes marinhos e equinodermos –, ameaçando ainda mais a biodiversidade.”
Castro mostrou pesquisas sobre a grande quantidade de microplásticos presentes em moluscos comestíveis, como ostras e mexilhões, no litoral paulista. Os poluentes também já foram encontrados em órgãos humanos, como pulmão e coração, além de sangue e placenta.
Aditivos
O gerente de Políticas do Clima do Programa da ONU para o Meio Ambiente (Pnuma), Vitor Pinheiro, também manifestou a preocupação global com outros grupos químicos: bisfenóis (BPA), ftalatos (BBP), per e polifluoroalquílicos (antiaderentes); halogenados e fosforados (retardadores de chama); e oxibiodegradáveis, que se transformam em microplásticos ou poeira de plástico.
“Materiais plásticos com aditivos que só quebram o plástico em pedaços menores são rotulados como biodegradáveis, mas não são. Isso vai virar microplástico e atrapalhar até a reciclagem, se for misturado”, explicou.
Os diferentes tamanhos, cores, formatos, tipos de resina e aditivos tóxicos são outros fatores que afetam a reciclagem do plástico, segundo os especialistas. A gerente de campanhas da ONG Oceana, Lara Iwanick, apontou várias lacunas na legislação, inclusive na Política Nacional de Resíduos Sólidos, que não aplica a estratégia de logística reversa às embalagens e não faz referência aos microplásticos nem a produtos descartáveis, como copo, sacola, canudo e isopor.
Nova coordenadora da Frente Parlamentar em Apoio aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODSs), a deputada Erika Kokay (PT-DF) concordou com a necessidade de ajuste na legislação.
“Precisamos fazer o recorte do plástico particularmente no ODS 12, porque significa uma emergência”, apontou. “Também é importante avançar o projeto de economia circular e exigir da indústria a descrição dos produtos que contêm microplástico.”
A ONG Oceana lançou a campanha “Pare o Tsunami de Plástico”, inclusive com abaixo-assinado de apoio ao PL 2524/22, atualmente no Senado. A ACT Promoção da Saúde apresentou na Câmara, ao longo da semana, a exposição “Uma pandemia plástica”, a fim de denunciar o rastro de poluição deixado pelas indústrias de tabaco, álcool e produtos ultraprocessados.
O seminário promovido pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável atendeu a requerimentos do deputado Nilto Tatto (PT-SP).
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